Gêmeos e comportamento
Mas será que um comportamento complexo como o envolvido com o divórcio, para citar um exemplo curioso e polêmico, poderia ser influenciado pelos genes? Se uma característica, como a inclinação ao divórcio, é realmente influenciada pelos genes, podemos prever o seguinte: se um gêmeo idêntico se divorcia, a chance do outro se divorciar seria grande também, pois os mesmos genes estariam em ação. Os gêmeos fraternos não apresentariam essa correlação de modo tão intenso, pois partilham metade dos genes.
A correlação entre adotados no mesmo lar pode ser um instrumento útil para verificar o peso do ambiente durante a infância no produto final, a personalidade adulta. Seria esperado, dentro da teoria da causalidade tradicional do desenvolvimento da personalidade, encontrar pelo menos algumas influências em comum pelo fato destas crianças dividirem o ambiente familiar, que é semelhante pelo menos alguns parâmetros como a personalidade dos pais, nível social, econômico e cultural, sistema religioso, etc. É evidente que ser criado no mesmo lar não quer dizer que os estímulos que incidiram na criança em desenvolvimento foram os mesmos. No entanto, a previsão da teoria tradicional é que, já que o ambiente apresenta semelhanças, haveria correlação moderada entre as crianças adotadas.
A correlação entre testes de personalidade e de Q.I. entre adultos que quando crianças foram adotados e criados no mesmo lar é zero (Ploomin, 1990). Ou seja, em outras palavras o ambiente compartilhado durante a criação no mesmo lar não teve nenhum efeito detectável em testes de personalidade ou Q. I. na fase adulta. É importante salientar que estes estudos surpreendem até mesmo os geneticistas comportamentais, que muitas vezes esperavam encontrar substrato empírico para fundamentar a teoria da causalidade tradicional, uma tradição de pensamento que também fez parte de sua formação.
MgGue e Lykken (1992), em outro exemplo curioso, verificaram que, se você tem um gêmeo idêntico que se divorcia, suas chances de se divorciar são seis vezes maiores do que seriam se seu irmão, por exemplo, não tivesse passado pela experiência do divorciar-se. Bem, se você tem um irmão gêmeo fraterno (não idêntico) divorciado suas chances caem para apenas duas vezes mais. A idade dos sujeitos variava entre 34 a 53 anos.
Em um artigo consistente sobre este tema, Jockin, Mcgue & Likken (1996, p. 296) concluiram que a personalidade prediz o risco do divórcio e, mais específicamente, “ isso ocorre em grande parte por causa da genética mais do que pelas influências do meio de que eles compartilham”.
Será que podemos concluir que o divórcio é hereditário? Sim e não. Sim, pois podemos interpretar adequadamente essa afirmação. A hereditariedade é um fator que tem valor preditivo quanto à probabilidade de divórcio (MgGue e Lykken, 1992; Jockin, Mcgue & Likken, 1996). Não, pois não estamos falando de um gene específico para o divórcio. Trata-se de uma correlação, e sabemos que correlações não envolvem, necessariamente, conecções causais. Uma terceira variável, como o nível de testosterona (em homens), pode causar o impulso pela dominância, comportamentos antisociais e criminalidade violenta e, talvez como um subproduto de outras tendências, a propensão ao divórcio (Mazur & Booth, 1998).
Esse aspecto dos traços herdados que tem como subproduto outros traços é uma das sutilezas do processo da interação gene-ambiente. Outra sutileza é a chamada “covariação gene-ambiente”. As vezes, uma determinada característica é gerada por eventos ambientais que estão correlacionados aos genes. Deste modo, aparentemente a característica se relaciona aos eventos ambientais, mas na verdade é produto de uma covariação.
A título ilustrativo, sabemos que a composição dos tipos de fibras musculares (lentas ou rápidas) das pernas é fortemente relacionada à herança genética. Isso coloca os portadores de uma maior proporção de fibras rápidas, desde cedo, em posição vantajosa quanto à disputas em corridas curtas, de velocidade. Eles passam a receber treinamento e atenção diferencial, e o sucesso retroalimenta os estímulos ambientais que os impulsiona a adquirir maior velocidade nas quadras. Assim, freqüentemente as propensões genéticas interatuam de forma complexa com os eventos da vida, dificultando a compreensão das relações causais.
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